Há umas semanas atrás, António Lobo Antunes fez uma bonita crónica sobre um dos melhores jogadores de sempre do SL Benfica e do futebol nacional, o saudoso José Águas. Este antigo ponta de lança protagonizou 13 épocas de águia ao peito, ganhando 5 campeonatos nacionais, 7 taças de Portugal e 2 taças dos Campeões Europeus, num total de 384 jogos e 374 golos marcados, tendo-se sagrado 5 vezes como o melhor marcador do campeonato nacional (51/52; 55/56; 56/57; 58/59; 60/61). É ainda hoje o 2º melhor marcador de golos na história do SL Benfica, só ficando atrás de Eusébio.
José Águas é também relembrado por ter sido o capitão de equipa nas duas finais vitoriosas na Taça dos Campeões Europeus, em 1961 contra o Barcelona e em 1962 contra o Real Madrid. Pela selecção nacional realizou 25 jogos em que marcou por 11 vezes. Foi descoberto pelo SL Benfica durante uma digressão a Angola em 1950, sendo que única derrota dos encarnados foi frente ao Lusitano de Lobito (1-3), onde pontificava o jovem Águas, que foi carrasco das águias nessa tarde ao marcar 2 golos. Nesse mesmo dia foi contratado pelo Benfica, o clube do coração, apesar do forte assédio do FC Porto. Fez a restante digressão com a equipa, só despindo a camisola rubra do "Glorioso" em 1963.
Foi lançado pelo treinador britânico Ted Smith em Setembro de 1950. Quem o viu jogar adjectiva-o de elegante, tanto no trato da bola, como para com o adversário, sendo um cabeceador exímio (muitas vezes apelidado de "cabeça de ouro"), o que aliado à sua forte impulsão provocava estragos nas balizas contrárias. Só em 1962, com a entrada do treinador chileno Fernando Riera, acaba por ser relegado para o banco, para a entrada de José Torres. Emigra então para a Áustria, para jogar pelo Austria de Viena, onde contabilizou dois golos em sete jogos partidas, terminado assim a sua carreira.
José Águas é também relembrado por ter sido o capitão de equipa nas duas finais vitoriosas na Taça dos Campeões Europeus, em 1961 contra o Barcelona e em 1962 contra o Real Madrid. Pela selecção nacional realizou 25 jogos em que marcou por 11 vezes. Foi descoberto pelo SL Benfica durante uma digressão a Angola em 1950, sendo que única derrota dos encarnados foi frente ao Lusitano de Lobito (1-3), onde pontificava o jovem Águas, que foi carrasco das águias nessa tarde ao marcar 2 golos. Nesse mesmo dia foi contratado pelo Benfica, o clube do coração, apesar do forte assédio do FC Porto. Fez a restante digressão com a equipa, só despindo a camisola rubra do "Glorioso" em 1963.
Figura 1- José Águas na disputa de bola pelo ar. |
O seu filho, Rui Águas, acabaria por seguir as pisadas do pai, tornando-se ponta-de-lança no SL Benfica, dentro do mesmo estilo, embora sem a mesma eficácia. Houve um momento em o filho se esqueceu da vocação benfiquista da família Águas, ao transferir-se para o FC Porto em 1988, pela falta de entendimento quanto aos valores de renovação do contrato. A ida para os rivais da "invicta" causou um grande rombo emocial no adepto benfiquista, não só pela qualidade futebolística do jogador, mas porque o nome do seu pai está inevitávelmente ligado ao clube, que, por sua vez, nunca lhe terá perdoado completamente por aquela desfeita.
Figura 2- Rui Águas festeja golo contra o FC Porto. |
Rui Águas esteve no FC Porto por duas temporadas, onde foi acossado pelos colegas de equipa, que lhe cantarolavam "Pássaros do Sul" (de Mafalda Veiga) enquanto entrava no balneário. Acabou por sair dos dragões, novamente rumo ao SL Benfica, onde foi a tempo de minimizar os estragos feitos ao nome "Águas", sagrando-se melhor marcador do campeonato nacional em 90/91.
Referências Bibliográficas:
A BOLA (s/d) - 100 figuras do futebol português.
Tovar, Rui (2010) - José Águas: o melhor dactilógrafo da Europa. Em linha: http://www.ionline.pt/conteudo/77414-jose-aguas-o-melhor-dactilografo-da-europa
Visão - crónica de António Lobo Antunes
Nunca admirei tanto um atleta como admirei José Águas. Para quê, portanto, ir ao futebol se ele já não se encontra no estádio?
Há mais de trinta anos que não assisto a um jogo de futebol. Não conheço os estádios novos, vejo, às vezes, um bocadinho na televisão. Mas entre os dez e os vinte anos não falhava um jogo do Benfica. E não falhei enquanto Águas jogou. Claro que não era apenas Águas: era Costa Pereira, Germano, Ângelo, Simões, Eusébio, Cavém, o grande Mário Esteves Coluna que Otto Glória considerava o melhor jogador português, outros mais artistas que jogadores, como José Augusto, por exemplo, a todos estou grato pela beleza e a alegria que me deram, porém nunca admirei tanto um atleta como admirei José Águas. Para quê, portanto, ir ao futebol se ele já não se encontra no estádio? Era a elegância, a inteligência, a integridade, o talento, e ao pensar em escrever o meu desejo era ser o Águas da literatura. Vi Pelé, Didi, Nilton Santos, Puskas, Di Stefano, Santamaria, tantos outros génios, no tempo em que o futebol não era ainda uma indústria nem os jogadores funcionários competentes, comandados por esse horror a que chamam técnicos: era pura criação, uma actividade eufórica, uma magia cinzelada, uma nascente de prazer, uma inspiração, um entusiasmo. Águas foi tudo isso e, muito novo, ganhou o respeito dos colegas, dos adversários, dos jornalistas da época, que os havia de grande qualidade, Carlos Pinhão, Carlos Miranda, Aurélio Márcio, Homero Serpa, tantos outros. Não jogava futebol: criava futebol, respirava futebol, inventava futebol, e teria sido um privilégio para mim conhecê-lo. Não para falar com ele, para o ouvir. A sua beleza física invulgar distinguia-o de todos os outros, a forma de se mover em campo era única, a autoridade sobre os companheiros natural e humilde. Os miúdos que iam comigo à bola chamavam-lhe senhor Águas, sem sonharem que era desse modo que Simões e Eusébio o tratavam, como tratavam Coluna.
Senhor Águas, senhor Coluna. Reconhecíamo-lo, do alto do terceiro anel, no estádio de então, onde, de tão longe, os jogadores minúsculos, pelo modo de correr, se deslocar no campo, passar, rematar, reconhecíamo-lo pelos seus golpes de cabeça, inimitáveis, pelo sentido da ocupação do espaço, pela simplificada geometria do seu futebol. Não tinha a garra de Ângelo ou Cavém, a força de Coluna, o gigantesco talento de Eusébio, o poder do drible de Simões, a velocidade de José Augusto: era uma espécie de rei sereno e eficaz, um aristocrata perfeito. Até a andar os olhos ficavam presos nele, na harmonia dos gestos, no modo de ajeitar bola, e eu, criança de dez anos ou adolescente de quinze, pensava tenho de trabalhar mais esta página, ainda não chego aos calcanhares de José Águas. Escrever como ele jogava, com a mesma subtileza e a mesma eficácia. Escrever como a equipa do Benfica, umas vezes à Ângelo, outras à Germano, outras à Coluna, e finalizar à Águas. Nunca deve ter ouvido falar em mim nem podia adivinhar que um garoto qualquer o tomava não apenas como mestre de futebol mas como mestre de escrita. Só, mais tarde, certos saxofonistas de jazz, Bird, Coltrane, Webster, Coleman, Hodges, alguns mais, tiveram, sobre o meu trabalho, influência semelhante. Mas Águas foi o meu primeiro e indisputado professor: escreve como ele joga, meu estúpido, aprende a escrever como ele jogava. Como morava em Benfica via-o, às vezes, no autocarro do clube e ficava, pasmado de admiração, a fitá-lo. Isto lembra-me o meu irmão Nuno chegando a casa de dedo no ar
- Toquei no Eusébio, toquei no Eusébio
como provavelmente, eu o faria, porque na infância e na adolescência o futebol era, para além de uma aprendizagem do mundo, um prazer infinito. A cor dos equipamentos
(o meu amigo Artur Semedo:
- Não sou um homem às riscas, sou homem de uma cor só)
a entrada em campo, o hino, tudo isto me exaltava e fazia feliz. E as vitórias, comemoradas em Benfica com bebedeiras eufóricas. Uma das minhas glórias secretas, confesso-o agora, consiste em ter visto a fotografia do meu pai no balneário do hóquei em patins do Benfica, de ele ter estado no Campeonato da Europa de 1936, em Estugarda, com vinte ou vinte e um anos, e de brincarmos com uma caixa de lata cheia de medalhas, a que o meu pai não dava importância alguma e eu considerava inestimáveis. Há pouco, a minha mãe
- O que faço eu a isto?
exibindo-me uma espécie de troféu ou de placas num estojo, que alguns anos antes de morrer a Federação de Patinagem lhe entregou, juntamente com outras antigas glórias, e que me recordo de o meu pai, que não saía, ir receber com satisfação secreta. Mas, claro, eu era só filho do Lobo Antunes, não era filho do Águas, e ainda sei medir as distâncias. Portanto, o que vou eu fazer a um campo de futebol se ele já não joga? Seguir os funcionários competentes de um negócio? Assistir ao bailado dos técnicos? Ver a fantasia substituída pela sofreguidão, a ambição pela avidez, o amor ao clube pela violência idiota? Claro que continuo a querer que o Benfica ganhe. Claro que sou, como em tudo o resto, parcial, sectário, por vezes sem bom senso algum. Mas há séculos que não sofro com as derrotas e, sobretudo, não choro lágrimas sinceras com elas: estou-me nas tintas. Contudo voltaria a trotar, radiante, para assistir à entrada em campo de Costa Pereira, Mário João, Germano, Ângelo, Cavém, Cruz, José Augusto, Eusébio, Águas, Coluna e Simões, a agradecer-lhes o facto de me terem, durante anos e anos, colorido a existência. E talvez no fim do jogo, postado junto ao autocarro, quando os jogadores saíssem do balneário, o senhor Águas me apertasse a mão.
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