terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Querido líder!

De acordo com as notícias que saem da Coreia do Norte, os coreanos estão lavados em lágrimas, desolados pela morte do seu "Querido Líder"... sem saber como irão conseguir sobreviver sem o tirano! "Mas não há razões para temer", dizem os órgãos de comunicação social norte-coreanos, o filho da mulher preferida de Kim Jong-Il, Kim Jong-Un, fará as delícias do povo... ou não! O mundo ocidental, por outro lado, vibra com a notícia, pois vê uma ténue hipótese de quebrar o último grande muro que ainda resta da "Guerra Fria", o do paralelo 38, resolvendo questões diplomáticas graves relativamente a um possível conflito militar que pudesse advir da política belicista do "Querido Líder".

O início da História da Coreia tem por base uma lenda do século XIII que refere a existência de um proto-estado do Calcolítico na zona actual da Península e parte Nordeste da China, o reino Gojoseon fundado por Dangun Wanggeom, o "neto dos céus", com capital na área de Pyongyang. O Reino perdurou até 108 aC, quando foi invadido pelos chineses da Dinastia Han, formando na área a norte os "4 Comandos de Han", que foram caindo, até restar o Comando Lelang, que só viria a cair em 313 dC. Esse tempo ficou conhecido como o "Período dos Vários Estados", em que no restante território da península coreana se foram formando e caindo diversos Reinos, estabilizando no "Período dos 3 Reinos". Os 3 Reinos da Coreia eram Goguryeo, Silla e Baekje, que rivalizavam e aliavam-se entre si, através de conflitos militares, pelo controlo da península. O primeiro reino referido, Goguryeo, era o mais poderoso e entrava em conflitos periódicos com a Dinastia Tang da China, ficando na zona Norte da Península, já Baekje situava-se na zona Sudoeste, concentrando-se em torno da actual Seul, por fim, o reino Silla era o mais recente, situando-se no Sudeste da península. Porém em 660 dC, o rei Muyeol de Silla  formou uma aliança com a Dinastia Tang e conquistou Baekje. No ano seguinte, a coligação, atacou infrutíferamente Goguryeo, que só viria a cair na campanha de 667, unificando quase toda a península sob o jugo de Silla.

No século IX o reino de Silla passou por tumultos sociais que ajudaram à sua queda. No reino vigorava um sistema de classes (bone rank, com 5 níveis), em que os cargos governamentais eram transmitidos por via hereditária, um sistema que a família real utilizava para dominar politicamente o reino, mantendo o poder dentro do seu sangue ou do seu circulo social, a alta nobreza. A nobreza local, hojok, formaram exércitos próprios, o que lhes deu algum poder para questionar o poder central e estabelecer poderes regionais autónomos. A cisão tomou contornos mais graves a partir de 2 eventos: (1) a crise sucessória ao trono, com a morte do rei Hyegong; (2) a revolta campesina de 889, devido aos elevados impostos que a Coroa e os Nobres tributavam. Silla tornou-se nos 100 anos seguintes um reino muito instável, com revoltas e golpes de Estado. No ano de 900 um antigo general de Silla, Gyeon Hwon, liderou tropas rebeldes na conquista de regiões no Sudoeste e no cerco à capita Mujinju, declarando-se posteriormente rei de Hubaekje, que pegará no legado do antigo reino de Baekje. Outro nobre dissidente de Silla, Gung Ye, formaria, pela força, o reino de Hugoguryeo (mais tarde Majin) em 904, formando uma nova tríade de reinos rivais.

Com as sucessivas conquistas, o reino Majin torna-se na potência militar da região, conquistando 3/4 da península, e Gung Ye torna-se num líder cada vez mais déspota, denominando-se Maitreya Buddha, fundido o poder político com o religioso. O general Wanggeon lidera uma revolta em 918 que o retira do poder, formando uma nova dinastia, denominada Goryeo, que se dizia descendente do antigo reino de Goguryeo. A fragilidade de Silla foi aproveitada por Hubaekje e Goryeo, disputando o seu território e rivalizando entre si, mas em 935 o rei Gyeongsun rende-se a Goryeo, aproveitando um momento de conflitos internos em Hubaekje, aquando da sucessão de Gyeon Hwon, que havia nomeado o seu filho mais novo, Geumgang, como o herdeiro do reino, o que originou uma revolta dos seus filhos mais velhos (de uma esposa anterior), com um golpe de estado que colocou Singeom, o filho mais velho, no trono, desterrando o seu pai num templo Geumsan, que por sua vez não tardou em escapar e juntar-se a Goryeo.

Goryeo tornou-se no reino dominante, conquistando Hubaekje em 936, reunificando a península e governando-a do século X até aos finais do século XIV. Neste período surgem códigos legislativos, uma Administração Pública, um forte desenvolvimento "industrial", o Budismo espalha-se por todo o território, apesar de conflitos com os confucionistas. As invasões mongóis do século XIII causaram alguma desrupção no reino, mas foi conseguida uma certa autonomia com a assinatura de um tratado de paz que o colocaria como um reino vassalo da dinastia mongol Yuan da China.

Em 1392, através de um golpe de estado, forma-se a dinastia Joseon (em honra de Gojoseon, "velho" Joseon), aproveitando a desintegração do império Mongol e o surgimento da dinastia Ming na China. A China dos Ming enviou a Goryeo em 1388 uma mensagem a exigir a devolução de parte do território do Norte de Goryeo. O general Choe, que fora suportado pela dinastia Yuan, entendeu a mensagem como uma declaração de guerra e atacou  a península de Liaodong, um território que faria parte do antigo reino de Goguryeo, tendo escolhido o general Yi Seong-gye para essa tarefa. Porém, Yi revolta-se e destrona o rei U em favor do seu filho Chang, mas mais tarde, devido a um contra-golpe, coloca Gongyang no trono, mas por um breve periodo, até ele próprio assumir a liderança de Goryeo, tornando-se no rei Taejo, eliminando os aristocratas leais aos reis anteriores, renomeando o reino como Grande Joseon, movendo a capital para Hanyang (actual Seul), onde construiu o palácio Gyeongbokgung, e formando a dinastia Joseon que durou 5 séculos.

Em 1394 o confuncionismo é adoptado como a religião oficial do reino, o que limitou a expansão do budismo. Com o rei Sejong o Grande o reino atravessou um período de grande prosperidade e inovação cultural e tecnológica, tendo sido promulgado o hangul, o alfabeto coreano. Contudo, nos séculos XVI e XVI a dinastia foi sendo enfraquecida pelas invasões do Japão (entre 1592 e 1598), da dinastia Qing da China e da Manchúria, levando a uma política isolacionista do reino, exacerbada também pelo medo do imperialismo ocidental, ficando conhecido como o "Reino Eremita". Depois das invasões da Manchúria, Joseon conheceu um período de 200 anos de paz. No século XIX, conflitos internos e a pressão internacional levou ao fim da dinastia Joseon, sob o jugo colonial japonês.

O Japão, depois da restauração Meiji, adquiriu tecnologia militar proveniente do Ocidente, e com essa vantagem forçou Joseon a assinar o Tratado de Ganghwa em 1876, abrindo os seus portos para o comércio e acabando com o protectorado chinês do Reino. Em 1894 assistiu-se à Revolta Campesina de Donghak, em que os camponeses, liderados por Jeon Bong-jun, derrotaram as força do líder local, Jo Byong-gap, na batalha de Go-bu, cujos bens foram distribuidos pelos camponeses. A incursão do exército campesino continuou, chegando até Jeonju, altura em que o governo de Joseon pediu ajuda à Dinastia Qing para debelar a revolta, tendo sido enviados 3.000 homens que forçaram os rebeldes a assinar as tréguas. Os japoneses consideraram a presença chinesa na península uma afronta e enviaram 8.000 homens para a região, tomando Seul e colocando um governo "fantoche" pró-japonês à frente do reino em 1894, o que deu origem à 1ª Guerra Sino-Japonesa, travada na Coreia. A imperatriz Myeongseong havia tentado combater a interferência japonesa na Coreia, pedindo apoio à China e à Russia, e deste modo é assassinada em 1895 por espiões nipónicos, orquestrado pelo Ministro japonês para a Coreia, Miura Goro.

A Dinastia Qing deu-se por derrotada no Tratado de Shimonoseki (1895), que garantia a independência da Coreia da China e uma hegemonia nipónica na região. Para reforçar o nacionalismo e integridade do reino, o imperador Gojong forma o Império da Coreia em 1897, um curto período em que se procurou desenvolver o país economicamente e tecnologicamente através de contactos com a Rússia. Em 1904 deflagra a guerra Russo-Japonesa sobre a Coreia, que termina com a vitória nipónica na batalha naval de Port Arthur em 1905, à qual se seguiu o Tratado de Portsmouth. O Japão ganha um maior domínio sobre a Coreia, tornando-a num protectorado pelo Tratado de Eulsa (1905), para a qual foi nomeado governador Ito Hirobumi, que acabaria por morrer assassinato pelo independentista coreano An Jung-geun em 1909. O imperador Gwangmu foi obrigado a abdicar do trono em 1907 em favor do seu filho, Sunjong, que se tornaria no segundo e último imperador da Coreia. Em 1910 o Império da Coreia foi anexado pelo Japão, por força do Tratado de Anexação Japão-Coreia, iniciando um período de domínio colonial nipónico de 35 anos.

A derrota japonesa na 2ª Grande Guerra pelos aliados, fez dividir o território coreano por 2 zonas de influência, durante a "Guerra Fria". Em 1945 os japoneses foram expulsos da Coreia pela guerrilha liderada por Kim Il-sung, apoiada pela URSS, ocupando quase toda a península, à excepção de Pusan, ocupada pelas forças americanas. O comité provisório popular da Coreia do Norte elaborou uma reforma agrária, abolindo a propriedade feudal, nacionalizou indústrias e a banca, proclamou a igualdade dos sexos e elaborou uma campanha de alfabetização. Em 1948 a Assembleia popular proclama a República Popular Democrática da Coreia, com capital em Pyongyang.

A Coreia do Norte, não reconhecendo legitimidade à República da Coreia e após a realização de eleições legislativas nesse território, tentou unificar o país avançando para Sul, nas zona dominada pelos americanos. O boicote da URSS ao Conselho de Segurança das Nações Unidas permitiram ao EUA considerar a Coreia do Norte como agressor e de fazer votar nas Nações Unidas uma acção militar contra a Coreia do Norte. Em Outubro 1950, os EUA invadiram a Coreia, que se encontrava apoiada pela China e URSS, dando origem a um confronto que duraria por 3 anos, até à assinatura do armistício de Panmunjeon, criando uma zona desmilitarizada, o paralelo 38, com influência soviética a Norte, e influência americana a Sul, formando-se dois países divididos que se proclamam como os herdeiros legítimos da nação coreana, faltando ainda a assinatura de um acordo de paz. Seguiram-se ligeiros confrontos fronteiriços e tentativas de assassinato a líderes sul-coreanos, como o atentado de Rangoon, em 1983, ao presidente Chun Doo-hwan, até que em 1976, a morte de dois militares americanos na zona  desmilitarizada da Coreia, que terão sido ordenados por Kim Jong-Il, filho de Kim Il-sung, que deu origem à operação Paul Bunyan que quase fez escalar um conflito de maior envergadura entre os dois blocos.

No Norte formou-se um regime à imagem da URSS, de ideologia comunista, monopartidário (Partido dos Trabalhadores Coreanos), totalitário e com um forte culto à personalidade. O governo de Kim Il-sung, o Presidente Eterno, adoptou a ideologia Juche, de auto-subsistência, identificando a população coreana como o verdadeiro motor do desenvolvimento do país. A crise petrolífera dos anos 70 mergulhou o país numa crise profunda, que veio a ser agravada pelo colapso da URSS e por uma série de desastres naturais, provocando um grave problema de alimentar, o que causou a morte de 900.000 a 2.000.000 de pessoas.

Na Coreia do Sul, sob um apertado controlo militar americano, o país viveu um período autoritário e ditatorial de direita, liderado por Syngman Rhee, que liderou o país até à revolta estudantil de 1960. Seguiu-se um período de instabilidade política, que terminou com o golpe militar do general Park Chung-hee, assumindo o controlo do país através de uma ditadura militar até ao seu assassinato em 1979. Seguiu-se outro golpe de Estado pelo general Chun Doo-hwan, que fez vigoral a lei marcial e reprimiu qualquer oposição ao seu poder, apesar dos protestos da população a favor da Democracia, como aqueles que ocorreram em Gwangju, fortemente reprimidos. A liderança despótica de Chun terminou em 1987, após um enorme levantamento popular contra o Governo após a tortura e assassinato de um jovem estudante universitário, originando eleições directas para a presidência, que foram ganhas à tangente por Roh Tae-woo, pertencente ao partido de Chun.
Figura 1- Cartaz de Propaganda norte-coreano.
Nos anos 90 a Coreia do Sul fez a transição para uma Democracia Liberal, no Norte, com a morte de Kim Il-sung (1994), seguiu-se uma transição para uma monarquia absolutista, passando o poder hereditariamente para Kim Jong-il, que segue a mesma linha isolacionista, secretista e belicista, adoptando a songun, uma política militar de modo a fortalecer o país e o seu governo, sendo o Estado mais militarizado do mundo, com um programa de armas nucleares que tem originado conflitos com a comunidade internacional, nomeadamente com os EUA. Entretanto, no fim dos anos 90, as Coreias adoptam a "Política do Amanhecer" numa cimeira em Pyongyang, com vista à aproximação dos dois Estados.

O armistício viria a ser interrompido em Maio de 2009 pela Coreia do Norte, quando a Coreia do Sul anunciou a adesão ao programa de "Iniciativa de Segurança contra a Proliferação", criada pelos EUA para impedir o tráfico mundial de armas de destruição massiva. A Coreia do Norte prosseguiria o seu programa de enriquecimento de urânio apesar da sanções da comunidade internacional, que a vê como um barril de pólvora prestes a explodir. Porém, com a morte de Kim Jong-Il abre-se uma janela de esperança relativamente ao futuro da península coreana, esperando-se Kim Jong-Un, o "grande sucessor", se desvie da linha seguida pelo pai por uma de convergência com a comunidade internacional e de uma progressiva unificação com a sua vizinha do Sul, algo que será sempre limitado pela China. No fundo são a mesma nação, divididas por uma guerra fria moribunda e ideologicamente falida, que partilham a mesma identidade, cultura e língua.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

O atirar da toalha ao chão!

O país precisa de um líder que tenha confiança no futuro, que acredite nas soluções que possam sair do seu Governo para dar a volta ao país... sugerir a certos profissionais qualificados a saída do país como solução, num momento em que precisamos de população activa com habilitações, jovem, com espírito crítico e massa cinzenta, que possa contribuir para o aumento da produtividade, do empreendorismo e para a sustentabilidade da Segurança Social é desacreditar o seu projecto governativo para Portugal.

Por falar em Segurança Social, é confrangedor a falta de soluções deste Governo no sentido de impedir uma enorme injustiça inter-geracional! Todos sabemos que a solução não é fácil... requer medidas difíceis e "ginasticadas", mas colocar nos ombros de uma geração, a que iniciou a sua actividade à cerca de 10/15 anos atrás, todo o peso da resolução deste problema é de uma injustiça atroz e de uma falta de imaginação tremenda. Segundo Passos Coelho, essa geração terá de fazer uma boa poupança, continuar a contribuir bastante com os seus recursos para a Segurança Social, para no futuro receber cerca de metade do que os actuais pensionistas recebem. Vamos lá a puxar pela cabeça e colocar todos os portugueses a contribuir para a solução deste problema, que na minha opinião passará sempre pelo combate à evasão fiscal, pelo corte cirúrgico de pensões, e pela consignação temporária de boa parte da actual receita do Estado sobre o consumo, entre outras medidas, como fomentar a reconversão profissional, o aumento da população activa e do emprego.

Sic Noticias

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Público: "Ambientalistas dizem que o acordo de Durban é um fracasso”

http://www.publico.pt/Mundo/reaccoes-ao-acordo-de-durban-1524614

O entendimento alcançado na conferência de Durban, África do Sul, foi “significativo” para o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-Moon, um “enorme sucesso” para os britânicos e “um passo em frente” para Assunção Cristas. Mas as organizações ambientalistas falam em “fracasso” e “falta de ambição”.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Sol: "OCDE coloca Portugal entre os países com maiores desigualdades"

Na minha mente não há a mínima dúvida que existe desigualdade na sociedade portuguesa... mas quando um organismo internacional como a OCDE o afirma é porque temos que dar atenção a este problema e tentar combatê-lo rapidamente, especialmente neste período em que se exigem sacrifícios à população portuguesa, caso contrário colocamos a nossa coesão nacional em risco. O problema é que este governo, tal como os anteriores, não parece "querer dar volta ao texto", pressionado por poderosos grupos de pressão para manter o status quo... esta crise continua a "cair nos ombros" de quem trabalha por conta de outrém, especialmente aqueles que não têm a mínima hipótese de escapar ao controlo fiscal, nos quais se incluem os funcionários públicos.

Não se trata apenas do favorecimento fiscal que se dá à banca, ou a conivência com a existência de um paraíso fiscal "à porta de casa", ou com a falta de combate à economia subterrânea, que se estima que signifique cerca de 20% do nosso PIB, ou ainda da protecção feita às grandes fortunas, ou das receitas ridículas que o Estado recebe de IRC, em que 10% do seu total provém somente da EDP (!!!!!)... mas é disto tudo combinado  e da falta de medidas de combate à evasão fiscal. 
Já se sabe que existem mais pessoas a "comerem" do Estado, do que a darem ao Estado... mas o problema não se esgota no progressivo desemprego e envelhecimento da população, mas no facto de muita da população activa e das empresas nacionais fugirem aos impostos e, quiçá, requerem, ainda por cima, subsídios para subsistirem. O IVA é de longe o imposto que mais receita dá ao Estado, seguido pelo IRS, numa proporção algo anormal quando comparada com os restantes países da União Europeia. Para quando, tal como se faz em quase todos os Estados civilizados, o levantamento do sigilo bancário ou o cruzamento de informações entre o IMI e o IRS? Seriam 2 enormes medidas para uma reforma fiscal cada vez mais indispensável, que permitiria apanhar aqueles individuos que pouco declaram em termos de rendimento, mas que dispõem de uma vida desafogada em termos de bens materiais (casas e veículos), e permitiria dissuadir "aldrabices" nas declarações de IRS, possibilitando um aumento significativo desta receita estatal.

O sistema actual faz com que o  grande esforço de "pagamento" da crise seja colocado apenas numa camada da população, cada vez mais minoritária, em favorecimento das camadas que estão por cima e que estão por baixo... se tal é compreensível para estas últimas, pela falta de recursos para a sua subsistência, para as classes de cima começa a ser algo de criminoso... se o esforço fosse mais repartido, porventura, os sacrifícios seriam menores para a classe média e mais justos socialmente, logo tornar-se-iam mais suportáveis não só materialmente, mas em termos psicológicos.

Richard Wilkinson, numa aparição ao programa TED Talks com o tema "How economic inequality harms societies", estabelece uma ligação entre o bem-estar social e individual (segurança, felicidade, esperança média de vida, saúde, sucesso escolar...) e a equidade que existe num país, nomeadamente ao nível de rendimentos. O investigador britânico através de dados estatísticos sustenta que para diminuir os problemas sociais de um país é verdadeiramente necessário evitar grandes diferenças de rendimento, redistribuindo eficazmente a riqueza... e quem melhor do que o Estado para fazer exactamente isso através do seu poder fiscal e das políticas públicas de âmbito social? Mas parece que a corrente neste país vai em sentido oposto...
Figura 2- Palestra de Richard Wilkinson sobre a Desigualdade Social.

PS- Reparem, no vídeo, onde está situado Portugal nos vários elementos estatísticos apresentados por Wilkinson.



Portugal continua a ser um dos países mais desiguais do mundo desenvolvido, com um fosso acentuado na distribuição dos rendimentos, e o mais desigual entre as economias europeias, revelou hoje a OCDE.
  

domingo, 4 de dezembro de 2011

Expresso: "Ministro da Economia leva «tareia» de deputado (vídeo)"

Tiago Mesquita
O ministro da nossa pobre Economia, Álvaro Santos Pereira, aflige-me. É verdade, chego a ter pena dele. Parece um miúdo habituado ao Farmville que se viu de repente com uma exploração agrícola verdadeira nas mãos. Quando foi apontado para o cargo ouvi grandes elogios ao senhor. De técnico admirável a economista de excelência. E acredito que sim. Tudo isto aliado a uma brilhante carreira universitária no Canadá e EUA e ao facto de não ser um político de carreira parecia ser o suficiente para que a nossa Economia estivesse em boas mãos. WRONG.

O que me preocupa é que a cada intervenção que vejo do senhor ministro a única coisa que consigo vislumbrar é uma enorme fragilidade, evidente atrapalhação, profunda falta de estratégia e visão, para não falar de um aberrante desconhecimento das matérias em causa. É assustador. Neste vídeo vemos o deputado do PCP Bruno Dias, aparentemente informado e com o trabalho de casa feito, a fazer gato sapato quer do Ministro quer do Secretário de Estado dos Transportes (Mas que raio de argumentação foi aquela? O senhor Sérgio Monteiro já alguma vez tirou as pantufas de Mangualde, Coimbra ou Lisboa e foi efectivamente a Londres? Bom exemplo? "Sustentável"? Meu Deus ...) Tudo isto é surrealista em demasia para ser verdade...salvem-nos!

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Diário de Notícias: Merkel- "União orçamental da UE prestes a ser criada"


A UE não precisa de ser refundada! Precisa antes que a voltem a colocar no caminho que estava traçado pelos seus pais fundadores, ao invés de estar na situação que se encontra de momento. Os países têm de fazer uma introspecção profunda para saber realmente se querem fazer parte do projecto europeu como estava delineado... e isso passa impreterívelmente por uma maior união e coesão, deixando egoísmos e elites nacionais de lado para partir para um ideal comum que beneficie os cidadãos que residem neste espaço, mesmo que no processo se percam parte das soberanias dos países como Estados independentes.

De facto, o projecto europeu, ao dar início a uma união monetária, saltou por cima de patamares essenciais para a construção de um edifício comum, muito pela relutância dos países em ceder parte das suas competências a um ente supra-nacional. Se é indiscutível que a falta de uma união orçamental faz parte dessas fases que foram esquecidas, também se distingue uma falta de união política e empowerment das instituições da União, matéria que já tratei em publicação anterior. Penso que está na hora de terminar com o preconceito relativamente a um federalismo europeu!

O que tem acontecido é que Angela Merkel, com Nicolas Sarkozy atrelado, está a tentar tomar decisões consoante aquilo que pensa que vai servir melhor os interesses do seu país, ignorando completamente a Comissão Europeia e os restantes parceiros europeus, mandando inclusivamente "recadinhos" para os governos dos países sob a mira dos mercados. Desta forma, temo que estejamos mais perto de uma desintegração do que de uma maior união dos povos da Europa, pois acredito que a grande maioria dos países não reconhece legitimidade destes dois Estados para impôr a sua vontade aos demais ultrapassando as instituições euopeias, ainda por cima, de acordo com sondagens, os seus governos não parecem dispôr de popularidade entre o seu eleitorado, sendo previsível uma derrota nas próximas eleições internas.

Uma união política, digamos federal, um BCE independente, um orçamento central e uma maior solidariedade entre os diferentes Estados são essenciais para que o Euro e a União Europeia sobrevivam a esta crise da Dívida Pública... que não nos esqueçamos que foi provocada pela crise dos Subprimes dos mercados financeiros. Em Portugal, apesar dos problemas estruturais que ainda necessitam de reformas profundas, do governo de Durão Barroso aos governos de José Sócrates o aumento da dívida pública vinha sendo claramente combatida e controlada à custa de orçamentos contraccionistas, até que em 2008 se dá a crise económica mundial que fez disparar os juros da dívida. Na Irlanda, a falência dos principais bancos do país, obrigaram a várias nacionalizações... tendo sido necessário um endividamento público massivo, que originou desconfianças dos mercados financeiros relativamente a solvabilidade da dívida irlandesa. Quando a Grécia entrou em dificuldades, a primeira reacção da Alemanha foi "descartar-se" de qualquer tipo de ajuda, o que agravou ainda mais a situação grega e, consequentemente, do resto da Europa! A hesitação em accionar mecanismos de solidariedade custou caro a todos os europeus, e criou uma enorme desconfiança dos investidores externos relativamente a este continente!

O plano de recuperação económica da troika tem implicado, para estes países, uma espécie de "castigo" aos seus povos através da austeridade, ao invés de apoiar um crescimento económico em paralelo com as tais reformas estruturais que tanto necessitam. Combater a recessão com medidas recessivas só vai aumentar a desconfiança dos mercados relativamente a solvabilidade da dívida, daí as agências estarem constantemente a descer o rating de países e bancos europeus. De acordo com os alemães e franceses, os "malandros" da periferia da Europa gastavam o que tinham e não tinham, mas não se podem esquecer que esses gastos  foram para comprar aquilo que as suas economias produziam, os carros (BMW, Mercedes, Audi, Wolkswagen, Renault, Peugeot...), a tecnologia (Grundig, Siemens...) e material militar (submarinos, corvetas...) e infraestrutural (TGV, Airbus...). 

Aquando da crise dos subprimes, a Islândia mergulhou num enorme fosso financeiro, aumentou a dívida pública massivamente para poder nacionalizar a banca... mas aconteceram dois aspectos curiosos que permitiram manter uma coesão social e fazer uma plena recuperação económica. Para o primeiro caso, julgaram e prenderam os responsáveis financeiros por detrás das falcatruas que deixaram o país à beira do abismo, por outro lado, colocaram a máquina rotativa de impressão de dinheiro a funcionar, desvalorizando a moeda e aumentando a inflação, o que significava uma perda de poder de compra dos islandeses, logo exportavam menos, mas diminuia o valor monetário dos seus produtos, facilitando as exportações.

Neste momento, Portugal vê as exportações como principal motor do desenvolvimento económico, criando uma expectativa edílica de enorme aumento em 2012, o que com a recessão generalizada nos países europeus, nossos principais parceiros comerciais (Espanha, França e Alemanha à cabeça), que também ambicionam importar menos e exportar mais, nos colocam numa situação muito frágil em termos de recuperação económica. O BCE tem agido de acordo com os interesses alemães, controlado por estes para ser uma cópia do Bundesbank, e deste modo, devido ao trauma inflacionista que a República de Weimar deixou no subconsciente alemão, o BCE tem servido essencialmente para controlar os níveis de inflação, estando impedido de colocar a rotativa a funcionar para poder eliminar parte da dívida pública e que possibilitaria a recuperação económica.

O combate à crise pela eliminação do estado social da Europa, criado nos fins do século XIX por Otto von Bismark (Alemanha) e que é a imagem de marca do Humanismo europeu, seria um retrocesso civilizacional pela perda de direitos e conquistas dos seus cidadãos, conseguidas  com muito esforço ao longo de vários séculos. A crescente tecnocratização dos governos está retirar alguma Humanidade nas medidas a tomar e a acrescentar um enorme défice democrático na vida dos Estados.

http://www.dn.pt/inicio/economia/interior.aspx?content_id=2162325

A chanceler alemã Angela Merkel disse hoje, no Parlamento, que a Europa está prestes a criar um união orçamental, depois de na quinta-feira ter discutido com o Presidente francês formas de "refundar" a Europa.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

O nosso Fado

Confesso que não sou um grande entusiasta do género... mas não lhe fico indiferente, tando ao género de Lisboa como o de Coimbra, pois apesar de distintos, quando bem interpretados tocam em qualquer um de nós, que pertencemos a este território "à beira-mar plantado".

O Fado está eternamente ligado às noções lusitanas de "destino" e de "saudade", um sentimento de separação daquilo que se conhece e se ama por infortúnios da vida. A bela guitarra portuguesa, com o seu som melancólico e "metálico", e a forma de canto dos fadistas, um entoar triste, com algo de "mourisco" que provém das entranhas da alma, tornam este género musical diferente de todos os outros, merecendo claramente a distinção pela UNESCO de Património Imaterial da Humanidade, dada a 27 de Novembro de 2011.
Figura 1- "O Fado" de José Malhoa (1909).
É curioso ver a evolução do Fado na sociedade portuguesa, surgindo no meio urbano mais pobre por volta do século XVIII, conotado com algo boémio, noctívago e sexual, o que o tornava num género marginal, ligado aos marinheiros, tabernas e bordéis de Lisboa, tendo inclusivamente uma dança que lhe estava associada e estando as suas personagens ligadas a uma forma de estar pouco convencional para a sociedade da época, havendo mesmo divisões entre grupos rivais. A mais notável fadista dessa época terá sido Maria Severa, uma cigana e prostituta que cantava e tocava o fado nas ruas da Mouraria. Com o aparecimento dos meios de comunicação de massa no século XX o Fado ganhou mais notariedade, foi "polido" socialmente, profissionalizou-se e divulgou-se pela rádio e casas de fado. Os fadistas, alimentando a aura de mistério e melancolia, começaram a trajar-se de negro, cantando a saudade, o sofrimento e o infortúnio. Fadistas como Ercília Costa, Carlos Ramos, Hermínia Silva, Alfredo Marceneiro elevaram o fado para outro patamar, inclusivamente para "fora de portas". Contudo, é com a grande voz de Amália Rodrigues que se dá a grande transformação do fado para um género mais sofísticado, reunindo nas suas canções grandes letristas e poetas como Alain Oulman, Pedro Homem de Mello, Alexandre O'Neill, David Mourão-Ferreira, Ary dos Santos, entre outros. Amália deixou uma marca indelével no fado, influenciando as gerações de fadistas que lhe seguiram, desde Carlos do Carmo a Mariza, tornando-o num género mundialmente conhecido. 
                                           Figura 2- "Povo que lavas no rio", por Amália Rodrigues (1961).

O Fado que, com o decorrer do século XX,  deixou de ser somente lisboeta para ser totalmente português, torna-se agora, no século XXI, em algo que pertence a todo o mundo. Podemos e devemos orgulharmo-nos de sermos portugueses nos dias que correm e apesar de tudo o que estamos a passar em termos económicos. Demos "novos mundos ao Mundo" com os Descobrimentos, espalhando e divulgando a nossa língua à Humanidade, imortalizada pelos escritos de Luís de Camões, Fernando Pessoa e José Saramago, e pelas vozes de Amália Rodrigues, Carlos do Carmo e Mariza.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

SL Benfica vs Sporting CP

No próximo Sábado estaremos em presença do maior derby do futebol português, o "velhinho" SL Benfica contra Sporting CP. Será, porventura, dos derbies mais aguardados dos últimos tempos, isto porque os leoninos conseguiram finalmente elevar a fasquia para um patamar do qual estavam arredados nos últimos anos, ombreado com o rival da 2ª circular.

A estatística diz-nos que em casa o SL Benfica é claramente dominador nos jogos contra o Sporting CP, conseguindo 41 vitórias contra 15 derrotas, havendo 21 empates pelo meio. Nos últimos 3 anos as águias têm levado de vencida os leões pelo mesmo resultado, 2-0. Claro que estes dados pouco importam... aliás, também reza a tradição que nem os momentos de forma das equipas servem de indicador, sendo sempre um jogo de tripla. 

Os verde-e-brancos, após um início titubeante no campeonato, atravessam uma fase de grande confiança, só manchada pelos resultados, pouco importantes, contra a selecção de Angola (amigável) e os romenos Viorel Hizo (Liga Europa). A competência de Domingos Paciência conseguiu alterar o rumo de acontecimentos para o clube de Alvalade, assim como a contratação do incansável Elias e o aparecimento do goleador Von Wolfswinkel, consubstanciando-se em múltiplas vitórias obtidas com naturalidade, mesmo jogando menos bem, beneficiando também de alguma ajuda da arbitragem, algo do qual se queixavam de início e com alguma razão... mas já se sabe como são os árbitros portugueses, quando o clube está mal, ajudam a piorar a situação, quando está bem, ajudam a melhorar.

Os vermelhos têm apresentado geralmente duas caras... uma de gala, como se tem visto para a Liga dos Campeões, e outra de serviços mínimos, para as competições domésticas, mas que, ainda assim, tem garantido os pontos necessários para o clube da Luz se manter como líder do campeonato nacional. Vindo de um empate em Braga (Campeonato nacional), de uma vitória à tangente contra a Naval 1º de Maio (Taça de Portugal) e de um empate em Old Trafford frente ao poderoso Manchester United (Liga dos Campeões), resta saber que SL Benfica irá surgir no derby frente ao seu rival lisboeta... todavia, a motivação para estes jogos aparece sempre... o que nem sempre aparece é a boa condição física, mercê de um complicado calendário competitivo, que tem tendência para piorar com os sorteios desfavoráveis para a Taça de Portugal e Taça da Liga. 

O favoritismo vai para a equipa da casa, como não podia deixar de ser, pois joga no seu reduto, mas também porque é uma equipa extremamente competente, contando com mais opções de qualidade no seu plantel, o que permite fazer a rotação de elementos ao longo das competições. Porém, o Sporting CP está com um grande élan, o que, aliado à maior qualidade que vem apresentando este ano, poderá surpreender o SL Benfica. Para os leões o empate fora será sempre um bom resultado, portanto não ficarei admirado se Domingos adoptar uma postura de maior contenção contra o SL Benfica, até porque uma derrota poderá esvaziar um pouco do "balão de confiança" que a sua equipa dispõe no momento. O SL Benfica terá obrigatoriamente de pensar em ganhar o jogo, tanto para manter a 1ª posição no campeonato, como para afastar os "demónios" do último empate na liga e acalmar a cavalgagem leonina para o topo da tabela.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Dinheiro Vivo: Governo centraliza no INA transferência de funcionários

Hélder Rosalino trouxe ao 8º Congresso Nacional de Administração Pública uma novidade interessante relativamente ao organismo que organizou o certame, o Instituto Nacional de Administração (INA), que de acordo com o PREMAC irá ser transformado numa Direcção-Geral. Retirei essencialmente a seguinte frase: "No fundo, o INA será o departamento de recursos humanos do Estado e os vários serviços da Administração Pública deixarão de ter a autonomia que tinham até aqui".

Ora, a meu ver os Concursos Públicos em Portugal têm dois grandes problemas: o custo e a transparência. O primeiro problema não será tão grave como o segundo, pois este deriva da injustiça, de uma certa corrupção ligada ao factor "cunha" (frequente na Administração Autónoma) na gestão de um organismo que é de todos os cidadãos portugueses, embora certos dirigentes lhe tenham um sentimento de posse. Penso que ambas as questões podem ser resolvidas através da mesma estratégia, a centralização do processo de contratação de Recursos Humanos para a Administração Central, e parece-me que é isto que Hélder Rosalino quer fazer com o INA.

O INA surgiu como entidade impulsionadora de uma formação aos quadros técnicos do Estado e seus dirigentes, à semelhança da École Nacional d'Administration Publique de França, preocupando-se com a evolução e actualização de conhecimentos relativamente a vários aspectos da Administração Pública. Dispõe do seu concurso público externo, o CEAGP (Curso de Estudos Avançados em Gestão Pública), que se realiza todos os anos (pelo menos até à 12ª edição) para a colocação de técnicos superiores em vários organismos da Administração Pública... um concurso de grande envergadura (uma média de cerca de 250 candidatos por ano), pois todos os licenciados poderão concorrer às vagas colocadas à disposição, tendo de se submeter a um rigoroso método de selecção, constituído por um teste de avaliação sobre várias matérias (Direito Administrativo; Contabilidade; Relações Internacionais; UE; Estatística; Inglês) cuja nota mínima deverá ser 12 para passar para a outra fase, a entrevista profissional. É claramente um método que aponta para o mérito do candidato.

Ora, pegando na Administração Central, e transferindo toda a capacidade que qualquer um dos seus organismos tem para organizar individualmente um concurso para recrutamento de pessoal, com júri próprio, para o INA, poder-se-iam poupar alguns recursos do Estado. Aliás, poderia organizar um grande concurso anual, em que os organismos, com base no seu mapa de pessoal, solicitariam as vagas de que necessitam ao INA, que após verificação da lista de excedentes em mobilidade, lançaria o empreendimento para as 3 categorias diferentes de funcionalismo público (Técnico Superior; Assistente Técnico; Assistente Operacional) com um júri próprio, desligado dos organismos.

Deste modo, poupa-se dinheiro em multiplos concursos que acontecem ao longo do ano, poupa-se tempo aos funcionários dos organismos, há maior controlo do processo pelo Ministério das Finanças sem custos para a agilização do processo, e há uma maior transparência, eliminando o factor "cunha", criando uma cultura de meritocracia e elevando os níveis de qualidade do servidor público.


http://www.dinheirovivo.pt/Estado/Artigo/CIECO023159.html

Hélder Rosalino, secretário de Estado da Administração Pública, anunciou o reforço de competências do Instituto Nacional de Administração.
 

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Expresso: "Governo não vai mexer nos salários da Função Pública"

A negação do Governo relativamente à vontade de Hélder Rosalino em mexer, novamente, nos salários da Função Pública não convence. Não faço ideia se há uma discrepância acentuada entre os salários que praticam no público e os que praticam no privado... se calhar se estudassem a questão a fundo, provavelmente iriam ter uma surpresa relativamente aos quadros qualificados, ou seja, se calhar a revisão viria em sentido de aumentar o salário do funcionário público licenciado.

Ainda assim não percebo as tentativas constantes de comparação entre o sector público e o sector privado... aliás o público tenderá sempre a puxar pelo privado e não o contrário! O trabalhador que exerce funções públicas tem de obedecer a um conjunto de regras e deveres que não têm somente em causa o benefício da entidade para a qual trabalha, mas deve ter em conta o interesse comum, gerindo recursos que são de todos e para todos... não há somente uma venda de bens e serviços para satisfação do cliente e do accionista da empresa ao alcançar o almejado lucro, mas o fornecimento de bens e serviços mediante regras definidas pelo meio político e que se vai consubstanciar em legislação e normas que devem ser seguidas escrupulosamente, mesmo que deixe o utente individual insatisfeito, pois há a noção de sobreposição do bem geral sobre o interesse individualizado.

Claro que a eficácia e eficiência e economia são pontos chaves em ambos os sectores, e pode ser algo a melhorar, cada vez mais no sector público, tal como a accountability (a responsabilização). O interesse que a actividade pública gera em todos os sectores da sociedade, afectando todos eles de modo individual e colectivo, o facto de lidar com os recursos fornecidos pelos cidadãos e destes terem direito de informação sobre todos os actos administrativos, faz com que todos os funcionários devam ser escolhidos por intermédio de um concurso público com métodos de selecção e avaliação estabelecidos a priori, com rigor, transparência e imparcialidade, pois a decisão final é alvo de um escrutínio rigoroso.

O serviço público é muito diversificado, integra ao mesmo tempo juízes, professores, engenheiros, arquitectos, médicos, polícias, militares, diplomatas, entre outros, e acarreta alguns condicionalismos que tornam necessário uma valorização e um reconhecimento distinto, não necessariamente financeiro. Caso contrário, irá assistir-se a um aumento da desmotivação e da corrupção no sector público, quebrando o frágil elo de confiança entre os cidadãos e os seus servidores, enfraquecendo o Estado... mas não será esse o objectivo por detrás disto tudo?


Apesar da vontade anunciada na passada sexta-feira pelo secretário de Estado da Administração Pública de aproximar o sector público ao privado, o Governo garantiu hoje que não vai mexer nas tabelas salariais dos funcionários públicos.
 

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Ignorância ou Má-Fé

De tempos a tempos somos brindados com "reportagens jornalísticas" que tentam passar um atestado de burrice às gerações mais novas. Fazem-se perguntas de cultura geral a transeuntes escolhidos ao "calhas" (ou não), e no meio de várias montagens e edições, convenientes com o objectivo proposto, lá sai uma reportagem que mostra que os nossos jovens são "muita estúpidos".

Será o tal preconceito geracional dos mais velhos em relação aos mais novos? Será apenas uma forma de tentarem fazer-nos rir? Será uma forma de branqueamento dos erros que foram cometidos na gestão do país pela geração que está no poder e que usufrui da maioria dos privilégios sociais? Os tais direitos adquiridos? O que é certo é que, a ser verdade, isto é, que os nossos jovens são tremendamente idiotas, a quem se deve apontar o dedo? A eles ou aos responsáveis pela sua educação e/ou modelo educativo? E que dizer da fascinante pergunta da jornalista "Qual é o simbolo químico da água?"

Afinal quem são os idiotas?



Vox Pop: A ignorância dos nossos universitários (vídeo)

16-11-2011

Por André Barbosa e Tânia Pereirinha e imagem de Joana Mouta e Bruno Vaz


quarta-feira, 16 de novembro de 2011

TOP 10 declarações de membros do actual Governo

10- Pedro Passos Coelho - Primeiro-Ministro:
09- Pedro Passos Coelho - Primeiro-Ministro:
[Sobre a decisão da agência Moody's de cortar em 4 níveis o rating de Portugal, colocando a dívida do país na categoria de lixo] «É o chamado murro no estômago»
08- Álvaro Santos Pereira - Ministro da Economia, Obras Públicas e do Emprego:
07- Vítor Gaspar - Ministro das Finanças e Administração Pública:
06- Alexandre Miguel Mestre - Secretário de Estado da Juventude e Desporto:
05- Álvaro Santos Pereira - Ministro da Economia, Obras Públicas e do Emprego:
04- Pedro Passos Coelho - Primeiro-Ministro:
03- Miguel Macedo - Ministro da Administração Interna:
02- João Duque - Líder do grupo de trabalho para a definição do conceito de serviço público na comunicação social, nomeado por Miguel Relvas:
01- Pedro Silva Martins - Secretário de Estado do Emprego:

Homem de valores!

Fiquei muito satisfeito pelo apuramento da selecção nacional de futebol para o Euro 2012... embora ainda possamos ficar arredados do outro Euro (€), de acordo com Angela Merkel e Nicolas Sarkozy. Jogámos como uma verdadeira equipa, o que permite que as individualidades se sobressaiam e que os erros dos árbitros sejam superados.

Apesar de Paulo Bento não gostar de ficar sob a luz dos holofotes, o crédito deste apuramento vai quase na totalidade para ele... pegou numa selecção com péssimos resultados iniciais na fase de apuramento, quebrada no seu espírito, revoltada pela liderança de Queiroz, sem união e espírito colectivo, e conseguiu, com tranquilidade, dar uma volta de 180º à equipa, incutindo-lhe sobretudo valores éticos. Claro que quando há mudanças, há resistência, visível nos casos "Bosingwa" e "Ricardo Carvalho", mas quando um líder é íntegro e forte esses problemas são debelados, apesar da forte pressão da federação e da imprensa nacional em querer desculpar atitudes "birrentas" e "egoístas" de atletas tendo em vista uma causa maior, o apuramento. Porém, com essa possível desculpabilização o líder perderia necessariamente o controlo da situação, o que poderia descambar num retorno a um período anterior, e nessa altura ficariamos sem equipa e sem apuramento. A selecção não pode ser vista como um item de currículo, ou como montra para uma valorização profissional, deve ser um orgulho e uma alegria poder contribuir para ela.

Figura 1- Paulo Bento, com tranquilidade, pede tranquilidade aos seus jogadores.
Nos dias que correm, no futebol e na sociedade em geral, os valores vão "perdendo gás" relativamente à prossecução de objectivos imediatos que proporcionem resultados, ainda que com "pés de barro"... é bom saber que temos ao "leme" da selecção nacional um Homem que não prescinde deles, que não cede a pressões exteriores, pena não ser assim noutros sectores da nossa sociedade. Mas não tenhamos dúvidas, a personalidade de Paulo Bento torna-o num alvo!

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Público: "Benfica, FC Porto e Sporting devem 350 milhões de euros aos bancos"

Quando se fala que o país e os portugueses terão de empobrecer, os clubes de futebol não são excepção... não me refiro apenas aos clubes "grandes" de Portugal, que todos os anos compram e vendem activos por milhões de €, mas também aos clubes mais pequenos das ligas profissionais, visível pela quantidade de jogadores estrangeiros a actuar em Portugal, cerca de 58% do total de atletas (sendo que os brasileiros compõem 32%)! Será que para os clubes passou a ser mais barato importar jogadores estrangeiros do que ter jogadores portugueses no plantel provenientes das camadas jovens? Acho difícil, mas o que é certo é que o jovem jogador luso tem tido cada vez menos oportunidades para se afirmar, o que se irá reflectir na selecção nacional a breve trecho.

Um clube grande ainda consegue viver dos investimentos de risco que faz na América do Sul, contratando um possível craque a um preço mais barato, para o revender mais tarde a um preço mais caro, caso a sua evolução decorra dentro da normalidade (o que muitas vezes pode não ocorrer). O problema é que os clubes sul-americanos pedem cada vez mais dinheiro por essas jovens incógnitas, o que torna o risco do negócio cada vez maior.

O nosso mercado de futebol, comparativamente com outros países da Europa (cuja situação também não é famosa, exceptuando os clubes alemães, mais contidos por força de um controlo mais apertado), é bastante pequeno... as receitas televisivas não são comparáveis, as de publicidade idem, a procura do adepto pelo espectáculo ao vivo está geralmente abaixo da oferta (raramente os estádios se enchem de pessoas), para além do mais, existe um enorme fosso entre os 3 grandes e os restantes clubes da nossa praça, pois, com honrosas excepções, os portugueses normalmente são adeptos destes 3 clubes, olvidando os clubes da terra e acentuando o bipolarismo Lisboa-Porto no nosso país. Ora isso faz com que os outros clubes dependam indirectamente do SL Benfica, FC Porto e Sporting CP para obterem uma receita digna desse nome (qual AutoEuropa!), nomeadamente através de transferências de jogadores (cada vez menos) e dos jogos que disputam com eles em casa .

Urge repensar o futebol, torná-lo mais atractivo para o espectador, mas também mais sustentável, porque se não o fizerem agora, de livre vontade, terão de o fazer um pouco mais à frente, à força. Estamos num momento de enorme crise financeira, em que os portugueses terão menos dinheiro para gastar em bens não-essenciais, para além do mais as empresas limitarão os seus gastos em publicidade, o que é um claro sinal de que as receitas dos clubes irão cair a pique...




O Benfica é o clube mais endividado à banca e com maior passivo
Os clubes de futebol estão dependentes do financiamento bancário e começam a sentir muitas dificuldades de acesso ao crédito. Segundo as contas de António Samagaio, professor do ISEG (Instituto Superior de Economia e Gestão), "a dívida financeira (empréstimos à banca e empréstimos obrigacionistas) da SAD do Benfica está em 157 milhões de euros, a do FC Porto em 98 milhões e a do Sporting em 95 milhões", o que totaliza 350 milhões de euros.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

O político Cavaco esqueceu-se do economista Cavaco?

Figura 1- Cavaco Silva faz uma saudação romana à mocidade de Portugal. 
Já anteriormente dissertei sobre os vários pecados cometidos pela Governação de Cavaco Silva que nos levaram à situação em que nos encontramos hoje... porém muito ficou por dizer e fico angustiado com o seu ar cândido de quem muito contribuiu para o estado actual do país e que desdenha outros governantes/políticos, tanto do seu partido como de outros, pois vieram estragar o seu "belo trabalhinho".

O Primeiro-Ministro Cavaco Silva beneficiou de circunstâncias excepcionais e irrepetíveis durante as suas legislaturas, 2 maiorias absolutas de 1 só partido, a organização das contas do país pelo Bloco Central, a entrada para a CEE, a 1ª leva de privatizações, o que fez com que o país em certas ocasiões tivesse 6% de crescimento anual da economia. Foi de facto um tempo de "vacas gordas", embora tenha havido um certo esquecimento no apoio e aposta nas forças produtivas do país. Ora, aquele que muitas vezes é considerado o "anti-político", mostrou desde essa altura que é, porventura, o maior político de todos, e, como tal, não escapou "às garras" da Teoria da Public Choice, esquecendo tudo o que havia aprendido como economista.

A Teoria da Escolha Pública considera, muito basicamente, que os políticos, eleitores e servidores públicos têm sempre em vista o interesse próprio quando exercem o seu poder, ou seja, os políticos ao pretender a reeleição tomam decisões que lhes permitam ter a simpatia dos eleitores, apesar de tomarem decisões erradas... os eleitores votam naqueles políticos que lhes prometem mais e melhor para os seus interesses... os servidores públicos pensam sobretudo na progressão das suas carreiras ao invés do interesse público.

Ora, no sistema capitalista existe o conceito de "ciclos económicos", flutuações da actividade económica a médio/longo prazo, alternado entre períodos de crescimento (expansão) e períodos de estagnação ou depressão (recessão). Os manuais de economia "mandam" que em períodos de expansão o Estado faça poupança, ou seja, retire dinheiro da economia, para que nos períodos de recessão possa injectar dinheiro na economia para a revitalizar. O que Cavaco político fez naquela altura de expansão económica, tendo maioria absoluta, foi atraiçoar o Cavaco economista, pois apesar de uma fase de boa expansão económica conseguiu aumentar a dívida pública, através de um aumento exponencial da despesa, ou seja, o contrário do que devia ter feito nesse período, mas como diz a teoria da Escolha Pública, o político actuou de modo a proteger os seus interesses!
Figura 2- Ciclos económicos.
Neste momento vemo-nos obrigados a actuar em contra-ciclo porque não há dinheiro para financiar a economia... não por erros recentes, mas por erros de décadas. Estamos a aplicar uma política contraccionista numa fase de recessão, o que é especialmente promovido por quem nos empresta o dinheiro (FMI, BCE), que ignoram que a mesma receita tem sido dada à Grécia com os fracos resultados que conhecemos.

sábado, 12 de novembro de 2011

Otelo Shakesperiano

"We cannot all be masters, nor all masters cannot be truly follow’d."
Othello. ACT I Scene 1.

"I have very poor and unhappy brains for drinking"
Othello. ACT II Scene 3.

"Your name is great, In mouths of wisest censure"
Othello. ACT II Scene 3.

"Reputation, reputation, reputation! Oh, I have lost my reputation! I have lost the immortal part of myself, and what remains is bestial."
Othello. ACT II Scene 3.

É com um certo espanto que vejo como certas figuras da nossa sociedade se vão "lavando" dos seus pecados com o passar do tempo... a memória é curta e selectiva, e lamento que uma certa opinião pública ainda faça reverências à "ovelha negra" dos capitães de Abril, que lá por ter contribuído para o fim do Estado Novo, não lhe dá o direito de passar incólume pelas situações que criou no país após o 25 de Abril.

Otelo esteve associado à tentativa de golpe de Estado do 25 de Novembro, acabando por ser preso durante 3 meses, após os quais se candidatou às eleições presidenciais de 1976, quedando-se pelo 2º lugar, a longa distância de Ramalho Eanes. Em 1980 cria o partido Força de Unidade Popular, que terá um braço armado, as Forças Populares 25 de Abril (FP-25). Esta organização terrorista, da qual foi líder, realizou inúmeros assaltos e assassinou 17 pessoas, entre militares, polícias e civis (dos quais se conta um bébé de 4 meses).

Foi preso em 1984, mas em 1985 sai do cárcere após a apresentação de recurso da sentença, aguardando o julgamento em liberdade provisória. Em 1987, Otelo é condenado a 15 anos de prisão pelo crime de terrorismo, contudo é libertado em 1989 da Casa de Reclusão Militar de Tomar, após 5 anos de prisão, tal como outros 27 arguidos do processo das FP-25. Em 1996 a Assembleia da República aprova uma amnistia para os presos das FP-25, promulgada pelo presidente da República de então, Mário Soares. O processo dos crimes de sangue prescreve em 2003, em que o Ministério Público deixou expirar o prazo para recorrer da sentença para o Supremo Tribunal de Justiça.


Estas declarações vêm na sequência de multiplas outras que vem proferindo nos últimos tempos, tais como o arrependimento de ter realizado a revolução dos cravos, ou da necessidade de termos um homem como Salazar no poder. O que me irrita é que Otelo se acha com uma moralidade superior para julgar os outros, exaltando a "sua obra", o 25 de Abril, mas que foi mal conduzida por outras pessoas, lamentando e mostrando uma certa amargura por não lhe ter sido permitido instalar outro regime ditatorial e totalitário em Portugal, ao invés de uma Democracia.

Otelo ainda veio lamentar  e mostrar-se chocado com as diferenças de rendimentos entre os portugueses, o que não deixa de ter razão, porém, devia olhar para dentro e retirar alguma vergonha pessoal, especialmente tendo em conta o seu passado terrorista. Em 2000, Otelo foi promovido a coronel de artilharia, mesmo na reserva, implicando o pagamento de uma indemnização de 49.800 €, referente à diferença entre os salários de tenente-coronel (cerca de 3.000 €) e de coronel (cerca de 3.500 €).

E de pensar que Cavaco Silva recusou a pensão requerida por Salgueiro Maia nos finais dos anos 80...

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Jornal de Negócios: "Aristocracia Fiscal"

Deixo aqui uma crónica bastante interessante do economista J. Albano Santos...

http://www.jornaldenegocios.pt/home.php?template=SHOWNEWS_V2&id=517387

Por razões bem conhecidas, os portugueses estão a ser convocados para um período de sacrifícios acrescidos, com especial incidência no plano fiscal. É de acreditar que, por maior que seja o esforço exigido pelo ajustamento macroeconómico em curso, as pessoas tenderão a enfrentá-lo com decisão se virem que ele é equitativamente repartido por todos. A reacção será, porém, muito diferente se alastrar o sentimento de que há grupos que conseguem escapar à sua parte nos sacrifícios.

Ora, esse perigo existe e é tão antigo como o próprio imposto. Aliás, a História ensina que o privilégio de grupos sociais isentos de tributação chegou a ser um facto aceite, quantas vezes com argumentos fantásticos: basta lembrar o caso do Arcebispo de Sens que, quando instado por Richelieu para passar a pagar impostos, retorquiu, indignado, que "o uso antigo era que o povo contribuísse com os seus bens, a nobreza com o seu sangue e o clero com as suas orações".

Embora o Mundo tenha mudado muito desde então, o eminente arcebispo continua a ter fiéis seguidores. É certo que, hoje em dia, o clero e a nobreza são tributados como toda a gente. Ainda assim, floresce entre nós uma nova espécie de "aristocracia fiscal" composta por pessoas que parecem estar isentas de impostos sobre o rendimento. Contribuem para o bem comum, claro está – mas com as suas valiosas opiniões sobre o Estado e a sua impagável censura às deficiências dos serviços públicos.

Esta moderna "aristocracia fiscal" é um grupo vasto e heterogéneo: pode envolver gente tão diversa como o biscateiro ou o empresário, o merceeiro ou o profissional liberal, o feirante ou o senhorio. Pessoas estimáveis, unidas por um traço comum – o de poderem subtrair o seu rendimento (ou boa parte dele) ao imposto devido. Não o fazem, aliás, por sofrerem de qualquer perversidade pessoal mas, simplesmente, porque os proventos que recebem têm características especiais do ponto de vista fiscal.

De facto, as matérias tributáveis não são todas iguais quanto à possibilidade de controlo pelo Fisco: umas são de difícil ocultação (v.g., rendimentos do trabalho por conta de outrem, património imobiliário); outras são mais fáceis de dissimular (v.g., rendimentos do trabalho por conta própria, património mobiliário). É nesta diferença que assenta a discriminação dos cidadãos em dois grupos: os que são forçados a contribuir para os cofres públicos e a dita "aristocracia fiscal" a quem é dado escapar alegremente.

Em condições normais, esta discriminação já é grave, dados os efeitos perniciosos que tem a vários níveis: no plano político, corrompe a cidadania e a coesão social; no plano económico, subverte a concorrência; no plano financeiro, lesa o erário público em somas avultadas (admitindo uma economia subterrânea na casa dos 20% do PIB e a sua tributação em termos médios, pode estimar-se que deixa de ser cobrado um valor da ordem dos 7% do PIB – algo que se aproxima do actual défice das contas públicas).

Na presente situação, porém, o fenómeno toma-se especialmente perverso: cada novo aumento de impostos que se decide vai sempre recair sobre os mesmos – os já sacrificados detentores de matérias tributáveis que o Fisco controla. Deste modo, agrava-se progressivamente a intolerável iniquidade entre uma classe média cada vez mais oprimida pelo esforço que lhe é exigido e uma "aristocracia fiscal" que permanece incólume, olhando para a crise com comentários piedosos.

Esta injustiça pode, aliás, vir a ter embaraçosas repercussões com a previsível ligação das condições de acesso a alguns serviços públicos (v.g., saúde, educação) ao rendimento das pessoas. Com este a ser aferido pelas declarações de IRS, não é impensável que, então, possamos ver, lado a lado num hospital público, um abastado homem de negócios e um professor de liceu – o primeiro isento de qualquer pagamento e o segundo obrigado a pagar uma parte significativa dos custos que origina.

Convenhamos: porventura mais difícil de suportar que qualquer fardo fiscal é a consciência da injustiça da sua distribuição. Claro que, no mundo real, uma repartição igualitária dos impostos é um ideal inatingível – mas a prática consente aproximações razoáveis. Qualquer delas passa, seguramente, por um caminho tão antigo que já o Padre António Vieira, no "Sermão de Santo António" (1642), o indicava nos seguintes termos: "não carreguem os tributos somente sobre uns, carreguem sobre todos", pois "se se repartir o peso com igualdade de justiça, todos os levarão com igualdade de ânimo".

Hoje, talvez mais do que nunca, é fundamental seguir este preceito, o que implica pôr a "aristocracia fiscal" a pagar impostos. Pretender acabar com a fraude e a evasão seria ridículo – mas é possível aplicar peias capazes de lhes reduzir o alcance. Para tal, o Fisco conta, aliás, com a preciosa ajuda do desertor do imposto que, com frequência, às declarações de rendimentos que roçam a pobreza, junta pedidos de registo em seu nome de bens (v.g., casas, automóveis) só acessíveis a gente de outro calibre financeiro.

Ligar as declarações de rendimentos aos bens sujeitos a registo que cada um possui é uma das técnicas mais eficazes de combater a fuga aos impostos – muito facilitada, aliás, pelos meios informáticos disponíveis. Não admira, pois, que o nosso Legislador a tenha adoptado, entre outras com o mesmo fim, na "Lei Geral Tributária". O que surpreende é que, mais de uma década após ter sido publicada, esta Lei continue sem a regulamentação conveniente para, neste importante aspecto, ser aplicada com eficácia.

O caso traz à memória Almeida Garrett quando, referindo-se às leis fiscais, lamentava que "sendo quase todas concebidas em tom decisivo e ameaçador, vão de tal maneira relaxando-se na execução, que quando se chega a querer verificá-las mais parecem súplicas do que leis" ("Imposto das décimas", 1827). Seria de dizer que, quase 200 anos depois, nada mudou nesta matéria – não fossem evidentes os ganhos de eficiência que a aplicação generalizada da informática trouxe ao Fisco.

Ora, a realidade é que a máquina tributária ganhou apenas uma eficiência selectiva, isto é: para uma parte dos contribuintes (digamos, a classe média) tornou-se implacável; mas para outra parte (a "aristocracia fiscal") continua tão inofensiva como sempre foi. Esta dualidade é especialmente indecente nos tempos que correm. Ou a combatemos até ao limite do possível, ou ela acabará por destruir a relação de confiança que tem de existir entre os cidadãos e o Estado – com as consequências que se podem adivinhar.