Na minha mente não há a mínima dúvida que existe desigualdade na sociedade portuguesa... mas quando um organismo internacional como a OCDE o afirma é porque temos que dar atenção a este problema e tentar combatê-lo rapidamente, especialmente neste período em que se exigem sacrifícios à população portuguesa, caso contrário colocamos a nossa coesão nacional em risco. O problema é que este governo, tal como os anteriores, não parece "querer dar volta ao texto", pressionado por poderosos grupos de pressão para manter o status quo... esta crise continua a "cair nos ombros" de quem trabalha por conta de outrém, especialmente aqueles que não têm a mínima hipótese de escapar ao controlo fiscal, nos quais se incluem os funcionários públicos.
Não se trata apenas do favorecimento fiscal que se dá à banca, ou a conivência com a existência de um paraíso fiscal "à porta de casa", ou com a falta de combate à economia subterrânea, que se estima que signifique cerca de 20% do nosso PIB, ou ainda da protecção feita às grandes fortunas, ou das receitas ridículas que o Estado recebe de IRC, em que 10% do seu total provém somente da EDP (!!!!!)... mas é disto tudo combinado e da falta de medidas de combate à evasão fiscal.
Já se sabe que existem mais pessoas a "comerem" do Estado, do que a darem ao Estado... mas o problema não se esgota no progressivo desemprego e envelhecimento da população, mas no facto de muita da população activa e das empresas nacionais fugirem aos impostos e, quiçá, requerem, ainda por cima, subsídios para subsistirem. O IVA é de longe o imposto que mais receita dá ao Estado, seguido pelo IRS, numa proporção algo anormal quando comparada com os restantes países da União Europeia. Para quando, tal como se faz em quase todos os Estados civilizados, o levantamento do sigilo bancário ou o cruzamento de informações entre o IMI e o IRS? Seriam 2 enormes medidas para uma reforma fiscal cada vez mais indispensável, que permitiria apanhar aqueles individuos que pouco declaram em termos de rendimento, mas que dispõem de uma vida desafogada em termos de bens materiais (casas e veículos), e permitiria dissuadir "aldrabices" nas declarações de IRS, possibilitando um aumento significativo desta receita estatal.
O sistema actual faz com que o grande esforço de "pagamento" da crise seja colocado apenas numa camada da população, cada vez mais minoritária, em favorecimento das camadas que estão por cima e que estão por baixo... se tal é compreensível para estas últimas, pela falta de recursos para a sua subsistência, para as classes de cima começa a ser algo de criminoso... se o esforço fosse mais repartido, porventura, os sacrifícios seriam menores para a classe média e mais justos socialmente, logo tornar-se-iam mais suportáveis não só materialmente, mas em termos psicológicos.
Richard Wilkinson, numa aparição ao programa TED Talks com o tema "How economic inequality harms societies", estabelece uma ligação entre o bem-estar social e individual (segurança, felicidade, esperança média de vida, saúde, sucesso escolar...) e a equidade que existe num país, nomeadamente ao nível de rendimentos. O investigador britânico através de dados estatísticos sustenta que para diminuir os problemas sociais de um país é verdadeiramente necessário evitar grandes diferenças de rendimento, redistribuindo eficazmente a riqueza... e quem melhor do que o Estado para fazer exactamente isso através do seu poder fiscal e das políticas públicas de âmbito social? Mas parece que a corrente neste país vai em sentido oposto...
Figura 2- Palestra de Richard Wilkinson sobre a Desigualdade Social.
PS- Reparem, no vídeo, onde está situado Portugal nos vários elementos estatísticos apresentados por Wilkinson.
Portugal continua a ser um dos países mais desiguais do mundo desenvolvido, com um fosso acentuado na distribuição dos rendimentos, e o mais desigual entre as economias europeias, revelou hoje a OCDE.
De acordo com o estudo 'Divided We Stand: Why Inequality Keeps Rising', da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), o fosso entre ricos e pobres atingiu o nível mais elevado dos últimos 30 anos. De acordo com vários indicadores, Portugal continua a ser um dos países mais desiguais do mundo desenvolvido, em que os 20 por cento mais ricos têm rendimentos seis vezes superiores(6,1) aos dos 20 por cento mais pobres, revela a OCDE.
Nos últimos 20 anos, o rendimento dos que menos ganham subiu em Portugal, em média, 3,6 por cento ao ano, acima da subida de 1,1 por cento registada nos rendimentos dos que mais têm. Em média, na OCDE, o fosso entre ricos e pobres é menos acentuado (5,5 vezes).
Ainda em relação a Portugal, o estudo demonstra que se trata de um dos países onde as transferências em dinheiro e em prestação de serviços públicos, como a educação e a saúde, revelam maior capacidade de atenuar o hiato entre os mais pobres e os mais ricos, com reduções superiores a 35 por cento, dez pontos percentuais acima da média do resultado médio das políticas sociais na OCDE.
Entre outras conclusões, o estudo destaca ainda que o rendimento de 10 por cento da população mais rica é agora nove vezes mais alto do que o das pessoas colocadas entre os 10 por cento mais pobres na generalidade dos países da região. De acordo com comparações tendo por base as variações no coeficiente de Gini (utilizado para medir a desigualdade de rendimentos), Israel, Estados Unidos e o Chile ainda são mais desiguais do que Portugal, que está ao nível do Reino Unido nos indicadores da desigualdade.
Nos últimos anos, o fosso entre ricos e pobres também cresceu nos países tradicionalmente mais igualitários como a Suécia, Alemanha e a Dinamarca, realça a organização.
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