quarta-feira, 16 de maio de 2012

Diário de Notícias: "Lince ibérico pode ser solução para áreas desertificadas"


O lince-ibérico (Lynx pardinus) é uma espécie mítica da fauna portuguesa. De tão mítica que é que se chega mesmo a duvidar da sua existência, tal como no caso de espécies mitológicas como os unicórnios, pégasos ou dragões. Porém, existe mesmo, pelo menos já foram avistados na vizinha Espanha e podem ser visitados em centros de recuperação da espécie em território nacional. A sua população está confinada a pequenos espaços, muito dispersos pela Península Ibérica, sendo que apenas 2 ou 3 agregados populacionais poderão ser considerados viáveis a longo prazo, estimando-se que existam menos de 80% de individuos relativamente há 30 anos atrás, uma população que vem em queda abrupta desde o início do século XX, quando se estimava que existiriam vários milhares desta espécie.
Figura 1- Lince Ibérico em liberdade.
O lince nativo da Península Ibérica tem uma pelagem castanho-avermelhada, coberta de manchas pretas, que podem ser desde pequenos pontos a riscas, não existindo dimorfismo sexual entre macho e fêmea. Tal como as outras espécies do Género Lynx, tem uma cauda pequena, pinceis de pelos nas pontas das orelhas e barbas. O peso médio de um macho adulto é cerca de 12 Kg enquanto as fêmeas pesam em média cerca de 9 Kg. É um animal essencialmente nocturno, muito solitário e territorial. Os acasalamentos ocorrem entre Janeiro e Maio e após um período de gestação que varia à volta de 2 meses, nascem entre 1 a 4 crias, que recebem cuidados maternais durante cerca de 1 ano, altura em que se tornam independentes e abandonam o grupo familiar, podendo atingir uma longevidade de 16 anos. É um trepador exímio e por dia poderá deslocar-se cerca de 7 km. As necessidades energéticas de um lince adulto correspondem à ingestão de um coelho adulto por dia, sendo que uma fêmea com 2 crias terá de caçar cerca de 3 coelhos por dia. Logo, calcula-se que a densidade miníma de coelhos para permitir a reprodução do lince será de cerca de 4 indivíduos/hectare.

É a espécie de felino mais gravemente ameaçada de extinção e também um dos mamíferos mais ameaçados do mundo, estando listada na CITES (IUCN). Em Portugal, a espécie permanece com o estatuto de "Criticamente Em Perigo", enquanto em Espanha está somente em Perigo. A principal ameaça resulta do desaparecimento progressivo das populações de coelhos-bravos (sua principal presa) devido ao aparecimento de doenças como a mixomatose e a pneumonia hemorrágica viral, que afectou o número de coelhos, piorando ainda mais a situação do felino. Outras causas relacionam-se com as mudanças ao nível do uso do solo, alterando os seus habitats e tornando-os mais vulneráveis e fragmentando as comunidades, mas também a sua caça, incêndios florestais, a utilização de armadilhas e os atropelamentos. A reduzida variabilidade genética das pequenas populações isoladas faz com que sejam bastante vulneráveis a doenças, como a leucemia felina, toxoplasmose, tuberculose bovina.

Este felino de clima mediterrânico procura o mato denso e bosques para refúgio e os espaços abertos para caçar, tendo um papel fundamental no controlo das populações de coelhos, parte essencial da sua alimentação embora também coma outros pequenos animais, como roedores, lebres, lagartos, perdizes e outras aves.  Os requisitos ecológicos do lince-ibérico podem resumir-se da seguinte forma:
  1. habitat potencial com condições adequadas de alimento e água ao longo do ano, vegetação adequada para abrigo/reprodução e tranquilidade;
  2. Mais de 50-60% do coberto vegetal dos seus territórios é composto por matagal e cerca de 20% por orlas entre pastagens e matagal;
  3. Os seus territórios, durante a época de acasalamento, a densidade de coelho-bravo é superior a 4,5 indivíduos/hectare;
  4. A ligação entre os diferentes núcleos é fundamental para a dinâmica da espécie. 
Actualmente só existem 2 populações reprodutoras (Doñana e Andujár-Cardeña, na Serra Morena), com efetivos totais entre 84 a 143 indivíduos adultos. A população de Doñana é composta por cerca de 35 indívudos e Andujár-Cardeña terá cerca de 110. Estas duas populações estão isoladas entre si o que ainda as torna mais vulneráveis. Os efectivos actuais não são suficientes para a sua sobrevivência a longo-prazo e os especialistas concordam que a espécie se encontra no limiar da extinção.
Figura 2- Distribuição geográfica do lince-ibérico em meados da década de 1990.
1 - Algarve-Odemira-Vale do Sado; 2- Gata-Malcata-San Pedro-S.Mamede; 3- W.Sierra Morena-Guadiana; 4- Alberche; 5- Gredos; 6- Subbéticas; 7- Doñana; 8 - Sierra Morena Central; 9- População central.

 

Figura 3- Distribuição geográfica do lince-ibérico de acordo com os dados mais recentes.
1- Doñana; 2 – Cardeña-Andujár.

Em Doñana, os territórios são estáveis ao longo da vida do indivíduo, sendo as áreas vitais dos machos, em média, maiores (10,3 km2) do que as das fêmeas (8,7 km2), sujeitas a flutuações em função da estação e das características do habitat. Em outras zonas de maior abundância de coelho, as áreas vitais dos linces são menores, com consequente aumento da densidade. Consta-se, que em Portugal, o lince-ibérico poder-se-á encontrar ainda na Serra da Malcata.

Estão-se a desenvolver, tanto em Espanha como em Portugal, programas de reprodução em cativeiro, através da captura de subpopulações inviáveis, sendo que no caso português tem tido papel fundamental o Centro Nacional de Reprodução do Lince-Ibérico de Silves. Em 2004, a Liga para a Protecção da Natureza lançou o Programa Lince, que conta com a participação e o apoio técnico e científico de um grupo composto por vários especialistas nesta espécie em Portugal, no âmbito do qual têm sido desenvolvidos projetos, entre os quais se o LIFE, que visa a recuperação do habitat natural do Lince Ibérico. 



http://www.dn.pt/inicio/ciencia/interior.aspx?content_id=2514139&seccao=Biosfera&page=-1

A ministra do Ambiente defendeu hoje que a reintrodução do lince ibérico em território nacional pode atrair pessoas para zonas desertificadas, mas alertou para a necessidade da coexistência equilibrada da espécie com a caça e a agricultura.

"O grande desafio é conseguir uma compatibilização dos usos no mesmo território de forma equilibrada", referiu Assunção Cristas, sublinhando que as regiões para aonde está prevista a introdução do lince serão valorizadas economicamente. Segundo a governante, a coexistência da espécie com a caça, a agricultura e outras atividades permitirá a existência de um território mais "rico", "ordenado" e "com capacidade para atrair gente". A ministra da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, falava hoje à margem da apresentação da implementação do Plano de Ação do Lince Ibérico, no centro nacional de reprodução daquele animal, em Silves.
O projeto que está a ser desenvolvido em cooperação com Espanha consiste na reprodução em cativeiro daquela espécie, com o intuito de inverter o seu processo de declínio e recuperar os núcleos que antes existiam.  Só este ano nasceram no centro de Silves 21 crias de lince ibérico (quatro não sobreviveram), uma taxa de sucesso, já que na anterior época reprodutiva, que decorre entre dezembro e março, nenhuma das crias sobreviveu.
Em menos de um ano alguns deste animais poderão ser reintroduzidos no seu habitat natural, em algumas zonas do país que, de acordo com Assunção Cristas, já estão a ser preparadas para tal, como Moura, no Alentejo.

"Se daqui a uns anos, tivermos na nossa terra o lince ibérico com uma convivência sustentável com as atividades que aqui há, vamos ter zonas muito interessantes para serem visitadas por portugueses e estrangeiros", observou Assunção Cristas. O Plano de Acção para a Conservação do Lince-ibérico (Lynx pardinus) em Portugal foi aprovado em 2008, mas só agora, quatro anos depois, deverá ser implementado. O Centro Nacional de Reprodução do Lince-Ibérico (CNRLI) foi inaugurado em 2009 com o objetivo de reintroduzir a espécie em território nacional.

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