sexta-feira, 2 de setembro de 2011

i: "Peter Villax. «Os portugueses não gostam de trabalhar»"

Peter Villax é um herdeiro de origem búlgara e francesa... portanto, não se deve incluir no "pacote" em que insere os portugueses, os "preguiçosos", mas que lá fora, na França, Alemanha e Luxemburgo, são vistos como bons trabalhadores. Se calhar nem é "8 nem 80", mas acho presunçoso alguém que teve tudo de "mão beijada" vir criticar um povo, especialmente a camada mais pobre que, segundo o administrador da Hovione, está condenada a essa condição pelo facto de não trabalharem, pois nas palavras de Villax: "O trabalho liberta-nos da pobreza!". É... mas pelos vistos não nos liberta da imbecilidade!

A entrevista também tem aspectos muito positivos e interessantes, mas confesso que fiquei logo desmotivado quando cheguei aquela parte do diálogo. Devo relembrar-lhe que Passos Coelho não taxou os ricos, mas apenas aqueles que trabalham, desta ultima vez atingindo os que até ganham bastante bem relativamente à media nacional, mas que efectivamente o fazem a conta de outrém. O problema é que a crise foi provocada pelos ricos e políticos, mas quem a paga a factura são sempre os mesmos. Mas sim, a ideia de Passos Coelho de taxar as empresas com lucros acima de 1.5 milhões e depois vir baixar a TSU é tudo menos coerente na tentativa de dinamizar a economia e criar empregos.

" (...) Baixar a taxa máxima de IRS de accionistas de referência em 1% por cada 250 empregos novos gerados (...)" é de facto uma ideia... com ideias tão boas porque é que este cavalheiro não se mete na política? A crítica aos políticos é bastante válida, pois muitas vezes "dizem alhos, mas fazem bogalhos", mas a mudança de mentalidade só será feita quando as pessoas de bem e cheias de projectos se inserirem nesse meio para tentar fazer algo pela causa pública, caso contrário fica tudo entregue à "bicharada", como acontece actualmente. E desse ponto de vista parece-me que o problema da falta de produtividade do país não é do trabalhador português, mas do dirigente português!

http://www.ionline.pt/conteudo/146726-peter-villax-os-portugueses-nao-gostam-trabalhar


O herdeiro da Hovione diz que só se lembram dos ricos para pagar impostos, mas não os desafiam a criar riqueza. "O empresário português é um privilegiado..."

Este é o homem que irritou Sócrates quando, numa conferência em que participavam empresários, economistas e políticos, disse ao então primeiro-ministro, que tinha acabado de discursar: "Eu tenho um problema essencial consigo: os seus actos não reflectem as suas palavras". Foi aplaudido de pé. Peter Villax, vice-presidente da Hovione, uma multinacional com sede em Portugal que factura mais de 100 milhões de euros, diz que os portugueses gostam de trabalhar... pouco!Qual a sua opinião sobre os aumentos de IRS e de IRC para os mais ricos ?É uma necessidade política mas um disparate económico. O Warren Buffett já diz há muitos anos que paga menos impostos que a secretária, mas isso tem a ver com os créditos fiscais americanos, que são muito complexos e permitem a um bilionário com bons advogados acabar por pagar relativamente menos. Mas aqui em Portugal a carta de Buffett foi o rastilho para a discussão sobre a taxação dos ricos, o que caí sempre bem na opinião pública, e permite dizer que estamos todos a partilhar o sacrifício, etc.

E não estamos?

É um tiro no pé, porque são justamente os ricos que têm dinheiro para criar emprego. Estou farto desta demagogia, os ricos não são o problema, os pobres é que são o problema! É com os pobres e com a pobreza que temos de acabar, não é com os ricos!

O que sugere?

Em vez de lhes pedirmos mais impostos, deviamos mas é baixar-lhes a taxa em troca da criação de empregos novos!

Faria muito mais sentido baixar a taxa máxima de IRS de accionistas de referência em 1% por cada 250 empregos novos gerados. Só nos lembramos dos ricos para cobrar impostos.

A Taxa Social Única ainda está a ser ponderada...

O meu objectivo, como empresário e como gestor, tem a ver com modelos e negócio, com produtos, com clientes, feiras, promoção, publicidade, patentes, invenções... Talvez preferisse aumentar a semana de trabalho, em vez de reduzir a TSU. Para mim, faria muito mais sentido.

A Lonza, uma empresa suiça cinco vezes maior que a Hovione, aumentou a semana de trabalho. E isto foi só a administração dizer a uma sexta-feira que a partir de segunda iriam aumentar a semana de trabalho. Todos concordaram.

Em Portugal, isso seria possível?

Não! Nós, por questões religiosas, não gostamos de trabalho. O trabalho foi o castigo por Adão e Eva terem cometido o pecado original. Hoje, o discurso extremou-se e o castigo tem que ser redimido com direitos e regalias sociais. Mas existe numa grande parte da nossa sociedade a ideia de que trabalhar, o menos possível! Safar-me ao trabalho, sempre que possa. O trabalho liberta-nos da pobreza!

Os salários em Portugal são justos?

Ganhamos pouco como povo. E temos que ganhar mais. Temos que abandonar o discurso de salários baixos, estamos todos fartos de salários baixos em Portugal. Mas temos que produzir mais.

Como se quebra essa mentalidade?

Mudando o discurso dos empresários e dizendo que a forma e o raciocínio dos sindicatos é totalmente anacrónica. Temos que valorizar o trabalho, não o ócio.

É um crítico do empresário português e dos sindicatos?

A sociedade tem que desafiar o empresário português. Os políticos têm que exigir mais ao empresário português. Portanto, a crítica é tanto ao empresário como à sociedade.

O que falha nesse relacionamento?

O empresário está extraordinariamente ligado ao lucro. E o lucro, em Portugal, é muito mal visto. Para mim, o lucro é a medida da saúde do negócio.

E porque é que o lucro é mal visto?

Portugal convive mal com questões de riqueza. Quando as nossas publicações falam sobre as pessoas mais ricas do país é para mostrar que os índices de desigualdade são cada vez maiores. O que é verdade, e é um problema que temos que atacar. Mas não é pelos ricos serem mais ricos, é por os pobres não enriquecerem.

Como é que isso se faz?

Temos uma economia baseada sobre o conhecimento. Pertencemos a um país moderno e sofisticado. Portugal é um país da linha da frente. É! Não somos um país do terceiro mundo.

Com que base faz essa afirmação?

Se olharmos para os rankings mundiais, estamos no fim do primeiro terço, mas estamos no primeiro terço.

Os rankings reflectem a realidade?

Para Sócrates os rankings eram importantes. Ele estudava a forma de fazer Portugal subir nos rankings e fê-lo de uma forma muitíssimo inteligente.

Isso significa que estamos lá não por mérito, não pela qualidade, mas sim pela inteligência no método...

Não. Sócrates acreditava nas avaliações. E fez aquilo que qualquer pessoa inteligente faria... Estudou o sistema da pontuação para saber como fazer subir Portugal. Não vejo nenhum mal nisso.

Dizia que é pelo conhecimento que uma sociedade enriquece...

Isso. E nós temos torpedeado o ensino em Portugal nos últimos 20 anos. O nosso sistema de ensino, ensino público, é o meio mais importante para enriquecer o país. E nós temos dito ao povo e aos seus filhos: não se preocupem com os exames, nós passamos por si. O resultado está à vista.

Portugal subiu no ranking da educação...

Temos um país mais ignorante do que há 20 ou 30 anos e o potencial de enriquecimento foi enfraquecido. Eu vejo isto: há 20 anos eu recrutava uma secretária com o 12.º ano, neste momento tenho que a recrutar com uma licenciatura, porque quem me aparece com o 12.º ano, infelizmente, já não está ao nível das necessidades. E isto acontece com várias pessoas que conheço.

Tem seis filhos, com idades entre os 11 e os 26 anos. Isso permite-lhe comparar o ensino português com o estrangeiro. Que comparação faz?

É desfavorável para o ensino português, que privilegia não o raciocínio, mas a resposta correcta. Não há raciocínio livre, não há desenvolvimento de raciocínio. Os exames portugueses de 12.º ano são uma dezena de perguntas, em que cada uma vale "x" pontos. O exame de Baccalauréat francês é uma pergunta, à escolha de três, com quatro horas para responder. E isso é muito mais desafiante para o aluno e para o professor, que vai ter de dar uma nota a um trabalho de seis páginas em que avalia o estudante não pela correcção da resposta, mas pela originalidade, pela capacidade de raciocínio, pela cultura geral, pela capacidade de citar autores...

Com o ensino superior é diferente?

Todos os meus filhos foram e irão para a Universidade portuguesa. O ensino superior português é de elevadíssima qualidade. As nossas escolas de engenharia são das melhores do mundo. O Instituto Superior Técnico é uma das melhores escolas de engenharia do mundo. E eu sei, porque temos na Hovione engenheiros vindos das melhores escolas do mundo.

Ainda sobre os sindicatos, o que é que podiam fazer que não fazem?

Conheço um grande sindicalista português que em privado tem uma conversa e com o microfone à frente faz um discurso bem diferente. Em privado, a conversa dele é quase igual à minha.

O que é que falha?

O que falha é que o sindicalista tem centenas de milhar de filiados que estão à espera de um determinado discurso, politicamente correcto, para que a massa associativa o siga.

É um problema de ego...

É um problema de expectativas políticas. Estamos completamente encurralados pelo paradigma do 25 de Abril de 1974, que determina a nossa forma de falar, de ser entrevistado, de fazer declarações públicas. Quantas vezes tenho falado com políticos e com líderes que em privado afirmam uma coisa e em público outra. Acho isso extraordinário.

O que pensa das empresas que têm domicílio fiscal fora de Portugal?

As empresas podem estabelecer as suas sedes onde lhes for mais proveitoso. Empresas como a Sonae, por exemplo, empregam dezenas de milhar de pessoas em Portugal, não na Holanda. A quantidade de impostos que são pagos ao erário público português graças ao trabalho dessas empresas é gigantesca. Aliás, a única coisa que resta aos estados para concorrer entre eles são as condições fiscais.

É a favor da harmonização fiscal?

Nunca vai haver uma harmonização fiscal porque os países precisam dessa liberdade para concorrer entre si. A Alemanha tentou que a Irlanda aumentasse o seu IRC de 12,5% para um valor muito mais elevado e não conseguiu.

As empresas europeias e americanas são penalizadas por países asiáticos?

Concorremos globalmente e alguns concorrentes não jogam pelas mesmas regras, facilitam, cortam na qualidade, e acabam por ter uma vantagem competitiva sobre nós. É o que chamamos a vantagem competitiva do incumprimento.

Qual deve ser o papel do Estado na economia?

Acredito em muito menos Estado e muito mais forte. Para termos um Estado melhor temos que começar por ter tribunais muitíssimo melhores. Fico admirado pela forma excelente como Portugal funciona na ausência completa de eficácia jurídica.

Como vê o futuro de Portugal?

Tal como se faz nas empresas, que têm uma missão, uma visão, valores, planos operacionais, plano estratégico, o governo tem que ter um plano. E não vejo problema absolutamente nenhum em que o rumo para Portugal saia do Parlamento, do conjunto dos grandes partidos. Tem é que ser consensual. E tem que ser para os próximos 25 anos. A Hovione quer ser a maior empresa do seu sector em 2028. E todas as pessoas que trabalham na empresa o sabem.

Falta visão?

Nos últimos dois anos a navegação foi à vista. E a vista era de uma semana. E temos que trabalhar em equipa. O que eu vejo em Portugal é uma discussão contínua do óbvio. Tudo se discute, não há cultura de consenso, não há cultura de concordância. Temporariamente, episodicamente, temos concordância, como acontece com o memorando de 78 páginas que nos dá um programa de governo imposto por fora.

Somos bem-mandados?

É uma questão de cultura, mas que se pode mudar. A posição do líder é absolutamente determinante para existir o tal alinhamento.

O facto de ser um país pequeno traz a Portugal uma maior dependência...

(Cortando a palavra) Que ideia, não somos nada um país pequenino. Mais pequenos que nós são a Bélgica, a Suíça, a Áustria, a Holanda, o Luxemburgo...

O que têm esses países que nos falta?

Confiança! Temos que acreditar em nós próprios. E temos razões para isso, temos futuro.

Qual é, para si, o grande perigo da sociedade actual?

A sociedade ocidental actual está em decadência. Vai continuar a ser um símbolo cultural, para o oriente, mas o poder económico e militar vai passar para a China. Eu vejo isso com enorme naturalidade, porque não podemos fazer absolutamente nada para contrariar esse movimento. É o resultado da nossa história e tem que ser acompanhado de forma pacífica.

E a Europa?

Sou pessimista em relação à Europa. O que podemos mudar na Europa tem essencialmente a ver com valores. Somos um continente cada vez mais fracturado em termos filosóficos e as posições extremam-se. A China é um país totalmente alinhado. Achei imensa graça quando, a seguir aos motins de Londres, as autoridades chinesas questionaram o governo britânico sobre a sua capacidade de garantir a segurança nos Jogos Olímpicos de 2012... Um comentário divertidíssimo, justamente porque a China foi criticada na preparação dos Jogos Olímpicos em Pequim devido à poluição e à segurança. Ri bem quem ri por último.

Voltando a Portugal... Mário Soares dizia há dias que reconhecia o capitalismo como o único sistema económico viável...

A grande fraqueza do capitalismo é que não se preocupa com questões sociais. Mas aí está. Acreditamos que temos que promover a igualdade ao mesmo tempo que temos um sistema económico que promove a desigualdade. E isto é fonte contínua de tensão. É isto que provoca os motins em Londres. Uma parte da população que não tem nada a não ser problemas e só tem um direito, o poder de fazer a revolução. E, periodicamente, fá-la.

A Hovione também tem vindo a fazer a sua revolução, com novos inventos. Porque é que há tão poucas patentes registadas em Portugal?

António Campinos, que foi presidente do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) até revolucionou a instituição e ainda fez alguns inimigos na indústria. Preocupou-se com o aumentou dos pedidos de patente em Portugal. E em termos percentuais subiu imenso: triplicou ou quadruplicou. Mas subiu de pouquíssimo para pouco.

Porquê?

Muitas patentes estão em nome individual. Como o registo é relativamente barato, e basta pagar uma anuidade, no caso de a patente se tornar valiosa é fácil vendê-la a uma empresa e realizar uma mais-valia pessoal.

Por outro lado, a nossa economia avançada continua muito focada nos serviços e tudo quanto é tecnologia de informação não tem poderes. Uma patente é um documento que demora um a dois meses a escrever e a preparar, tem de ser afinada, é feito um depósito, depois as autoridades têm 18 meses para fazer uma avaliação. Ora, na área das Tecnologias de Informação, em dois meses mais 18 meses já o produto está inventado, industrializado, comercializado e morto. Ou seja, patente, tecnologia de informação, não interessa.

O empresário português preocupa-se com o desenvolvimento?

O empresário português é um privilegiado, porque a sociedade exige-lhe muito pouco. Exige-lhe só, e cada vez mais, que pague os seus impostos, mas não lhe exige que gere riqueza. Portanto, está sobretudo preocupado com um retorno muito rápido do seu capital.

Quanto gasta a Hovione em investigação e desenvolvimento?

Gasta seis milhões de euros. Isto coloca-nos na 30.ª posição no ranking.

Faz-se boa investigação em Portugal?

Como lhe disse, José Sócrates tinha uma enorme ambição e a sua forma de governar era fazer com que Portugal subisse nos rankings. Um ranking particularmente fácil de subir, porque é estabelecido exclusivamente pela despesa financeira, pelo investimento, era o de I&D. Para subir no ranking de I&D, Mariano Gago pediu e obteve 500 milhões de euros para a Fundação para a Ciência e Tecnologia e o apoio do SIFIDE, um sistema de crédito fiscal que já vinha do tempo de António Guterres, ao abrigo do qual 30% dos gastos em investigação e desenvolvimento são dedutíveis na matéria colectável.

Com que resultados?

Esse é o grande problema, isto não garante resultados.

É possível continuar assim?

Se estamos a gastar tanto dinheiro público, então o contribuinte tem que se sentir beneficiado pelos resultados dessa ciência. Neste momento há uma enorme relutância em abandonar o actual modelo de financiamento.

Qual é a alternativa ao modelo actual?

Não basta apenas, como até aqui, provar que se gastou o dinheiro. Tem que haver uma componente de avaliação sobre os resultados produzidos. As avaliações, que até agora são extremamente quantitativas, têm que ser qualitativas. Temos avaliar o resultado e não apenas o esforço.

Como é que isso pode ser feito?

Temos que pôr as universidades e empresas a colaborar muitíssimo mais. A ciência pública vai ter que servir o cidadão. Se ele paga, a ciência tem que ser em seu benefício. E quando eu digo cidadão português, digo o cidadão do mundo. Portugal tem uma tradição em medicina tropical de longas décadas, devido às nossas colónias. Em vez de ter a sua investigação pulverizada, que é uma coisa que acontece em todos os institutos públicos, cá ninguém sabe o que o outro está a fazer. Deviam existir desígnios nacionais.

Quais seriam, pode dar exemplos?

Teriam que ir ao encontro dos problemas de Portugal. Escassez de meios energéticos, por exemplo. Nós não temos energia. Então, vamos dirigir parte da questão para aumentar a eficiência dos sistemas, aumentar a rentabilidade da energia eólica. O envelhecimento da população. O que a afecta são doenças neuro-degenerativas características de idades avançadas: Parkinson e Alzheimer. Vamos concentrar-nos nas curas. Portugal tem uma grande relação com África. Os problemas da África são a Malária, a subnutrição... Então, vamos ver o que é que a nossa investigação pode fazer para ajudar essas populações. E vamos transformar os nossos institutos virados para a resolução de problemas. Desaproveitar isto é blasfémia pura!

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